Outro livro em Português, outra vez Ricardo Araújo Pereira. Espero que não pensem que todos os livros que leio em Português são dele, não é o caso. Tenho dezenas de clássico da língua portuguesa à minha espera: Fernando Pessoa, António Lobo Antunes, José Saramago … até Luís de Camões! Mas há algo nos livos de Ricardo Araújo Pereira que me atrai e me faz querer lê-los primeiro, em vez de me concentrar nos clássicos. Quiçá seja a sua indiscutível filosofia: “estar vivo aleija”.
Neste caso, o livro “Estar vivo aleija” é uma compilação de artigos publicados no jornal brasileiro “Folha de São Paulo”. Todos os textos do livro podem ser encontrados na internet, na página da “Folha de São Paulo” aqui: https://www1.folha.uol.com.br/colunas/ricardo-araujo-pereira/
Já disse isto noutro post do mesmo autor, mas se não conheces Ricardo Araújo Pereira (os portugueses conhecê-lo-ão mais pelos seus programas de humor na rãdio e na televisão, não necessariamente como autor; os brasileiros, pelas ocasionais cooperações com outros comediantes brasileiros e umas quantas entrevistas com o Jô Soares; os outros países de língua portuguesa, não o conhecerão, de todo) recomendo que dês uma vista de olhos à sua biografia na Wikipedia (a versão em português tem bastantes detalhes): https://en.wikipedia.org/wiki/Ricardo_Ara%C3%BAjo_Pereira
Ricardo Araujo Pereira normalmente publica dois ou três livros por ano, compilações das suas rúbricas de “Mixórdia de Temáticas”, na Rádio Comercial (Portugal), e das suas colunas «Crónicas da Boca do Inferno», na revista Visão (Portugal), e na Folha de São Paulo (Brasil). Como partilhei acima o link para os artigos publicados na Folha de São Paulo, deixo aqui também o link da revista Visao: https://visao.sapo.pt/opiniao/cronicas/boca-do-inferno/
É muito interessante, para quem conhece as outras obras de Ricardo Araújo Pereira, observar como ele teve de modificar a sua maneira de escrever para torná-la interessante ou atraente para um público estrangeiro, neste caso, o brasileiro.
«Estar vivo aleija» é uma série de histórias curtas, todas mais ou menos do mesmo tamanho e número de palavras, uma vez que pertence à mesma seção do jornal em que são publicadas. O humor de Ricardo Araújo Pereira é muito particular, cheio de ironias e observações sobre a realidade. Se tenho de fazer um comentário geral sobre o livro, acho que, apesar de que muitos o vejam somente como uma coleção de anedotas, é de uma grande qualidade literária. Mas, para fazer uma análise correta, seria preciso analisar os textos individualmente. Entre tantas histórias diferentes, e a dificuldade de escrever, semanalmente, uma coluna para um meio de grande distribuição/circulação como este jornal brasileiro, há momentos em que a qualidade sofre, mas, de tempos em tempos, encontramos textos incríveis, críticas acutilantes da actualidade e perdoamos imediatamente o Ricardo por qualquer falta de qualidade ou visão noutras histórias.
Comentário final: De todos os livros de Ricardo Araújo Pereira que li, devo dizer, infelizmente, que este não foi um dos meus favoritos. Embora as culturas portuguesa e brasileira sejam semelhantes em muitos aspectos, não acho que as pessoas no Brasil entendessem se ele fizesse uma piada sobre o sotaque de uma pessoa do norte de Portugal: e é aí que reside a grandeza do humor de Ricardo, nos regionalismos. Acho que o humor observacional dele é muito bom (diria até que é excelente) e que, em muitos casos, os assuntos com os quais ele lida são universais, mas “Estar vivo Aleija” é composto inteiramente de textos desse estilo. Querendo abarcar tanto, acaba por não focar-se em nada e o livro parece um pouco diluído para poder «conformar» o público brasileiro. É, ainda assim, Ricardo Araújo Pereira, não me entendam mal, e os seus textos ainda são incríveis, apesar disso – só que, entre o seu vasto trabalho, existem livros melhores.
Citação do livro: “Mas foi a dureza dela que me ensinou uma coisa preciosa que, provavelmente, horroriza todos os profissionais da saúde mental: desvalorizar os meus sentimentos. Primeiro, por serem sentimentos; segundo, por serem meus. Primeiro, porque a maior parte dos sentimentos goza de um prestígio que não merece; segundo, porque a minha importância é bastante relativa.”
Continuem a ler, sempre!
Perguntas para responderem nos comentários:
Já leram algum livro de Ricardo Araújo Pereira? E, em particular, leram «Estar vivo Aleija»? Gostaram? Concordam com os meus comentários finais sobre o livro? Já leram algum livro semelhante do mesmo género que gostariam de recomendar? Ou de algum outro autor português? Por favor, respondam na secção de comentários.